“este movimento circular não necessita de pernas, o universo foi criado sem pernas nem pés” Platão, Timeu

A Árvore da Vida corresponde ao centro cósmico de um universo perfeito e circular, no sentido em que Platão já havia descrito no Timeu.

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Santa Maria de Penamacor, em Lugo, finais séc.XII

No Jardim do Éden existiam duas árvores: a da Vida e a do Bem e do Mal. Foi desta que a serpente maligna tentou Eva e esta deu a provar o fruto a Adão, tendo como consequência a Queda e o conhecimento do bem e o mal, ficando por realizar a promessa de eternidade (enquanto qualidade) da Árvore da Vida.

Segundo a lenda uma semente foi salva e colocada na boca de Adão, de forma a dar sentido à vida, permitindo o aperfeiçoamento da Humanidade. Quando Adão morreu, a semente paradisíaca fez renascer da sua cabeça a árvore de onde foi feita a cruz.

A morte de Cristo é acompanhada pela árvore seca e pela simbólica do seu renascimento: o sacrifício e o ciclo da árvore do Éden apontam para uma dádiva – a da possibilidade de Salvação. A busca deste jardim Éden foi uma constante do viajante medieval. Nesta altura ainda o Oriente estava banhado numa aura mítica, razão pela qual era para essas paragens que se viajava em sua busca.

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Tímpano Dinton, Bucks, Inglaterra

De acordo com as lendas, esta Árvore do Paraíso Terrestre elevava-se num rio de água límpida como o cristal, que jorra directamente do trono de Deus.

Era conhecida por peridixion, termo que deriva de uma adulteração de paradision. Nos bestiários aparece como o peridens, uma árvore que nasce na Índia e dava frutos doces, dos quais se alimentavam as aves.

A árvore simbolizava Deus; os frutos Cristo e a sombra o Espírito Santo. As pombas representam os homens – se temos connosco o espírito santo, o Dragão/Demónio não nos pode atingir, mas apanha-nos se nos afastarmos da Igreja.

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Peridexion com dragão

Os animais que rodeiam a árvore sagrada é que podiam mudar, alterando-se o sentido da mensagem.

Quando não era o dragão que corria, de nascente para poente, atrás da sombra dos ramos, podiam, a árvore podia aparecer ladeada por felinos. O bafo das panteras e dos leões tinha o poder de ressuscitar as próprias crias- ligando-se a um sentido cristão de ressurreição.

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Leões/panteras com tondos- portal manuelino da matriz do Alvor, meados século XVI

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Leões/panteras- Árvore da Vida- matriz do Alvor

O sentido da perpétua renovação e regeneração da Árvore da Vida é reforçado pela Roda do Universo ou “rosa cósmica”, que podia aparecer na iconografia do Paraíso como centro do mundo, lugar de louvor e triunfo espiritual.

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Roda do universo ladeada por grifos- Bridekirk, Inglaterra.

Assim se encontra nas representações de alguns portais medievos ingleses e, de forma muito extemporânea e rica de sentido, no portal manuelino da matriz do Alvor.

Razão pela qual o estranho tímpano do portal da igreja conventual de Penamacor, em Lugo, datado de finais do século XII, pode ter simbologia idêntica, sem precisar de se recorrer à evocação da lenda de Chretiens de Troyes- “A Matéria da Bretanha”.

Os cavaleiros armados, em trânsito por este local mítico, evocam mais facilmente os combates da alma e as bravuras contra os animais fantásticos, que guardavam o jardim do Éden, do que o tema do cavaleiro que salva o leão do ataque de uma serpente. A estranha figuração central, não será apenas uma cruz inscrita no lago, mas um duplo simbólico da fonte/roda cósmica, trono de Deus, jardim circular de cujas águas saciam a sede dos animais angélicos que dele nunca se afastaram.

Consultar: El Físiólogo. Bestiario Medieval, Marino Ayerra Redín e Nilda Guglielmi (eds. e trads), Rivadavia, Editorial Universitaria de Buenos Aires, 1971. M.W. Tisfdall. God’s Beasts, Identify and Understand Animals in Church Carvings, Plymouth, Charlesfort Press, 1999; Arthur H. Collins; MA McBride, Symbolism of Animals and Birds Represented in English Church Architecture, New York, Nast & Company, 1913. Michael J. Curley, Physiologus, Austin, University of Texas Press, 1979 Harley 3244, London, British Library, MS., fol. 58v, Inglaterra, depois de 1255. Rocio Sanchez Ameijeiras, “Las artes figurativas en los monasterios cistercienses medievales gallegos”, in Arte de Cister em Portugal e Galiza, Fundação Pedro Barrié de la Maza/Fundação Calouste, Gulbenkian, 1908, pp.99-139. Maria Manuela Braga, “Alguns dados para o entendimento da iconografia do portal da igreja matriz do Alvor”, Medievalista , IEM, ano 3 ● número 3 ● 2007

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